Em nossos caminhos espirituais, muitos já devem conhecer algo sobre o Tantra. Em livrarias, artigos ou até mesmo em bancas de jornal, o tantra tem sido divulgado entre nós de forma cada vez mais rápida e diversificada, inclusive em inúmeras comunidades no Orkut, sites, cursos, workshops, etc.
Um fator que deve ser motivo de nossa preocupação é a qualidade e fidelidade dessas informações, se estão ou não preservadas em sua essência, se estão ou não baseadas nos ensinamentos tântricos de mestres como Tilopa, Naropa, Saraha, Gorak, Milarepa, etc. Não é raro lermos matérias e artigos com chamadas do tipo, descubra os segredos do orgasmo tântrico, seduza o seu parceiro através do tantra, tenha mais orgasmos! Será que é isso que esses honoráveis mestres espirituais propunham através do Tantra?
Parece que para evitar essas distorções, esses mal-entendidos, esses mesmos mestres e muitos outros, ensinavam secretamente o Tantra, que passou a ser conhecido como veículo secreto, dharma secreto ou modo de vida secreto, pois de alguma forma sabiam que a compreensão errada, a prática mal entendida em suas bases, poderia ser mais prejudicial do que benéfica.
Mas afinal, o que há de secreto no tantra? Porque no ocidente passou a ser sinônimo de sexo? O que queriam evitar quando o denominaram de modo de vida secreto? Há algum perigo em suas práticas? Entender essas questões é primordial para entendermos o próprio sentido do tantrismo. Para tal, devemos nos recordar, que o tantra é uma tradição espiritual, um conjunto de conhecimentos e práticas profundamente enraizados na meditação, que se propoem a nos conduzir a um estado além do desejo, além do círculo de sofrimentos causado pelo apego aos prazeres sensoriais e não a um reforço do prazer através do desempenho de qualquer espécie.
Entretanto, o que diferencia o tantra das demais tradições e o que o torna exclusivo e tido como um caminho elevado para a iluminação é justamente o uso do “veneno” como o antídoto do próprio “veneno”, isto é, penetrar em nossa própria ilusão para superar a ilusão, penetrar em nosso próprio desejo, para superar o desejo. Esta é a chave principal do tantra: permitir entrar na sexualidade, de forma consciente e contemplativa, para ir além das próprias amarras do sexual, se permitir adentrar na raiva, para superar as ilusões da raiva. Isto é, só iremos transcender algo, se pudermos vivenciar esse algo de forma plena, consciente e meditativa. Em leu livro, O Mundo do Budismo Tibetano, encontramos a seguinte exposição do atual Dalai Lama:
“(…) Portanto, num sentido, podemos dizer que é a própria ilusão – na forma da sabedoria derivada da ilusão – que efetivamente distrói as ilusões, pois é essa bem-aventurada experiência da Vacuidade, induzida pelo desejo sexual, que dissolve a força dos impulsos sexuais… Essa utilização das ilusões, como parte integrante do caminho da iluminação, é uma característica exclusiva doTantra”. (p.142)
Outra característica importante do Tantra é ser considerado um método que lida com características femininas, como a sensibilidade, a percepção, a intuição, o relaxamento, em contraponto com as tradições e sistemas eminentemente masculinos, que lidam com a resistência, o esforço, a superação, a ação. Quanto a isso, o mestre indiano Osho, compara as tradições tântricas com a tradição do yoga e afirma serem tradições não só diferentes, como até mesmo opostas. Enquanto o yoga é uma tradição masculina, yang, solar, onde o praticante é estimulado através do esforço e da ação a superar a si mesmo, superar a dor, aprimorar a postura e a resistência, o tantra é uma tradição feminina, yin, lunar, onde se trabalha a capacidade de relaxamento, de prazer, de seguir nossa natureza de forma meditativa e não lutar contra ela.
Ir. Carlos Eduardo Bouzada